terça-feira, 20 de julho de 2010

A MINHA CRÍTICA SOBRE O LIVRO DE ANTONIO CICERO O MUNDO DESDE O FIM

Hoje reli, com caneta e lápis em punho, o primeiro capítulo do livro de Antonio Cicero O MUNDO DESDE O FIM. Abaixo, algumas considerações que faço e que encaminhei via e-mail ao próprio Antonio Cicero.

Prezado Antonio Cicero,

Permita-me colocar algumas ponderações quanto ao primeiro capítulo do seu livro. Gostaria que me respondesse se não for incômodo a você:

1 - Logo no início você tenta se apoiar em Platão, Aristóteles, em termos latinos, gregos e germânicos, para tentar persuadir e ao mesmo tempo dissuadir ideias suas e ideias do senso comum´;

2- Você antes de questionar o moderno, já pressupõe que todos saibam o que vem a ser contemporâneo e não questiona o conceito. (Vide o que pensa Agamben acerca do Contemporâneo);

3 - Com isso, não quero dizer que você deveria saber se Agamben conceitua Contemporâneo do mesmo modo que você;

4 - Mas é só para ensarmos que poderíamos enveredar pelo conceito contemporâneo, já que se forma pela junção de `con -tempo` -- (qual tempo?);

5 - O fato de Platão e Aristóteles fazerem citações, isso não daria uma segurança lógica à argumentação, porque princípio da autoridade;

6 - `Quando alguém usa a expressão este instante, está a se referir ao instante em que se encontra´ . Ante essa afirmação, compreendo que o instante seria uma fragmentação de um tempo universal, que está biunivocamente ligado ao sujeito;

7 - Posso então dizer que: AC ----> INSTANTE / WLC ---> INSTANTE / X ---> INSTANTE / ÔMEGA ---> INSTANTE;

8 - O instante, nesse sentido, sendo um fragmento (particularidade) de um tempo universal;

9 -Será que daqui a 200 anos o seu tempo (ac) será o mesmo que de Platão e Aristóteles?

10 - O instante depende de cada cogito de quantos ichs houver?

11- Assemelha-se muito ao modus operandi de Descartes, por isso sujeito a críticas que tento elaborar a Descartes ( Não digo mimesis);

12 - Quanto às positividades, será que tomando um pouco do conceito ôntico-heideggeriano, seria possível pensar sem o ar e céus ( materiais) ?

13 - Ou seja, a razão suficiente só é razão suficiente enquanto o ich pensa ou vive?

14 - Nesse sentido, poderíamos dizer que a modernidade dar-se-á sempre que houver um ich para conceber o instante?

15 - Ou seja, a Modernidade é própria dos homens que são e que serão e não mais dos que já foram?


Um abraço e o meu muito obrigado
wilson luques costa






Caro Wilson,
1. No livro, digo que Platão elipticamente chamava os homens de sua época de “oi nûn”. “oi nûn” representa “oi nûn anthrwpoi”, sendo “anthrwpoi” elidido. “Nûn” é um advérbio, logo, não é declinável. O sentido de “oi nûn anthrwpoi”, logo, de “oi nûn”, é “os homens de agora”, isto é, “os homens modernos”. Mesmo em Homero já se encontra essa construção, com esse sentido, como se lê no Liddell & Scott.
2. “Agora” significa “neste instante”. No livro, afirmo que “ao dizer (i.e. ao usar a expressão) ‘neste instante’ – ou agora – significo o instante em que ME encontro”. Isso quer dizer simplesmente que a palavra “agora” significa o instante em que eu – seja quem eu for – me encontro. Isso porque a palavra “este” significa algo que está junto a mim, seja quem eu for.
Isso não me autoriza, porém, a dizer que “cada sujeito está biunivocamente ligado ao instante”, de modo que haja tantos instantes quanto sujeitos. Por que? Porque agora é APENAS o instante que está junto a mim, que o penso ou falo, e não o que está junto a outros sujeitos, A MENOS QUE ELES SE ENCONTREM NO MESMO INSTANTE QUE EU. Não há outros instantes que sejam diferentes do meu e, no entanto, sejam ESTE INSTANTE, isto é, sejam AGORA. Se outras pessoas existem agora é porque existem NESTE instante, definido pelo fato de ser o instante em que eu, seja quem eu for, me encontro. Só a primeira pessoa determina o sentido de “este” em cada caso.
Dei um exemplo disso: Sócrates falava “agora”. Mas o “agora” de que ele falava não é mais agora, e sim outrora, pois “agora” se define sempre em relação a mim, que o penso ou falo: enquanto o penso ou falo; e Sócrates não existe mais neste instante. Por outro lado, um contemporâneo meu, como, por exemplo, Wilson, é alguém que existe neste instante: isto é, no instante em que eu também me encontro, logo, alguém que existe agora.
O mesmo, aliás, ocorre com a palavra “aqui”. “Aqui” significa sempre este lugar, isto é, o lugar onde eu me encontro. O lugar onde outros sujeitos, como Wilson, se encontram, não é aqui, a menos que estejam onde eu também me encontro.
3. Sobre a sua observação de que “enquanto for possível cogitar, haverá modernidade”, observo o seguinte.
“Moderno” significa “agoral”, isto é, significa “referente a agora”, isto é, significa “referente ao instante em que me encontro”. De certo modo, portanto, é verdade que sempre há coisas modernas, no sentido de serem coisas referentes ao instante em que me encontro. E sempre algo será tanto mais puramente moderno quanto mais se refira exclusivamente ao instante em que me encontro. Por exemplo, Platão, no trecho citado, estava opondo os homens modernos – os homens do instante em que ele se encontrava – aos homens de antigamente. É em oposição a algo considerado antigo que se determina o moderno, nesse sentido.
É isso que parece justificar a sua afirmação de que "enquanto for possível cogitar, haverá modernidade".
A questão que surge, então, é a seguinte: será, então, que todas as épocas sempre foram, no seu tempo, modernas? Não haverá nada que distinga a época moderna – a modernidade – das demais?
Sim, muitas coisas: em particular, exatamente o fato de se classificar de “moderna”. Outras épocas se denominavam a partir de nomes próprios de lugares, dinastias ou pessoas, ou características políticas ou religiosas. Os romanos, por exemplo, demarcavam o tempo tendo por referência a fundação (mítica ou real, pouco importa) de Roma. Distinguiam a época anterior à fundação de Roma da época posterior a ela. Consideravam viver na época posterior à fundação de Roma. A partir do imperador Augusto, passaram a diferenciar também, na história de Roma, a monarquia, a república e o império: diziam então viver na época do império, ou de tal ou qual imperador. Os chineses e os egípcios usavam os nomes de suas dinastias para diferenciar as épocas, inclusive aquela em que viviam. Já os primeiros cristãos passaram a demarcar o tempo tendo por referência o nascimento (mítico ou real, pouco importa) de Cristo: para eles, sua época era a época cristã.
São quase sempre nomes próprios de lugares, dinastias ou monarcas, ou características políticas ou religiosas, que servem para denominar ou demarcar as diferentes épocas. Foi a redescoberta da antiguidade clássica pelos humanistas que ocasionou um modo diferente de considerar a história. Para os cristãos, como eu disse, a grande divisão era a que separava época posterior ao nascimento do Cristo da época anterior a ele. Fora disso, um homem do século XII, por exemplo, não supunha haver qualquer solução de continuidade entre si próprio e o mundo antigo. É verdade que, como já foi dito, a palavra “modernus” foi usada pelos cristãos, pelo menos a partir de Cassiodoro, no século VI, mas ninguém pensava em falar em “ Época Moderna”. Assim, a palavra “modernus” ainda não tinha sentido epocal. Os “modernos” eram simplesmente os contemporâneos.
Foi em oposição tanto à maneira de pensar e de falar quanto ao gosto dos seus contemporâneos escolásticos, isto é, dos “modernos” de então, que os humanistas ambicionaram emular tanto o modo de pensar e falar quanto o gosto dos antigos. Entre estes e aqueles, porém, se interpunha um período extenso, que tivera início na invasão e destruição do Império Romano pelos bárbaros. A essa longa intermissão, que passaram a considerar uma época de barbárie entre a civilização dos antigos e a sua redescoberta da mesma, os humanistas deram o nome de “medium tempus” ou “media tempestas” e, depois, “medium aevum”, de onde o nosso “medievo”, que também se diz “idade média”.
Com o tempo, os tais escolásticos “modernos” desprezados pelos humanistas passaram a ser considerados remanescentes da Idade Média, e estes passaram a ser os verdadeiros modernos. A partir disso, entre os séculos XVI e XVIII, criou-se o famoso esquema tríplice de divisão da história, que persiste até hoje. Tem-se a Antiguidade, a Idade Média (para onde foram relegados os escolásticos “modernos”) e a Época Moderna ou a Modernidade.
Pela primeira vez, a palavra com a qual uma época se autodenomina é um conceito universal. Com isso, “moderno” não se refere a coisa alguma que possa particularizar a época assim autodenominada. Em princípio, qualquer época poderia ter-se chamado de “moderna”. Entretanto, justamente o fato de que, apesar disso, nenhuma outra época o tenha feito, constitui, para a época que o faz, uma diferença mais radical do que qualquer outra concebível. É como se, enquanto cada uma das demais épocas tivesse escolhido definir-se – o que é perfeitamente compreensível – por aquilo que a distinguia das demais, a época moderna tivesse preferido não se definir; como se tivesse preferido abdicar de escolher uma particularidade que lhe conferisse distinção; como se, no fundo, ela não se considerasse uma época particular entre outras, mas uma época universal, ou, o que dá no mesmo, uma anti-época, isto é, a própria abolição da epocalidade. É como se não se vivesse mais numa época particular, mas, simplesmente, no eterno agora.
Um abraço,
Antonio Cicero




Blog: http://www.antoniocicero.blogspot.com

Prezado Antonio Cicero,

Abro o e-mail agora e leio rapidamente a sua explicação que é muito boa, aliás. Faz um tipo de anamnese histórica. Vou reler com mais calma. Por exemplo acerca do oi nûn, você justificou a ausência dos (homines) ok, mas percebo que o advérbio tornou-se um tipo de genitivo ( homines agorae) estou brincando e sacaneando um pouco o latim. Mas, pálin, isso é o que menos importa... Gosto da sua reflexão, se bem entendi, de os homens não tomarem para si o sentido de modernidade, sendo que os, vamos dizer assim, os contemporâneos o fizeram. E pensando dessa forma, eu não vejo porque eu estou errado em meu racocínio (lógico) em apontar a moderninade como um ousía que é movida pelo sujeito. O problema é que os sujeitos de antanho ao moverem o instante não reconheceram a modernidade. Se é assim, poderíamos dizer a contrapelo que o homem ´pós-moderno´- não obstante percebê-la não a reconhece, aliás; a reconhece, mas tenta de uma certa forma transpassá-la, mas agora por uma volição própria do tipo racional.

# Prezado Antonio Cicero, gostaria que percebesse o meu respeito por você e pelos seus textos; não me imiscuo neles com outro propósito, que não seja o de compreendê-los. Como dizia Platão, a oralidade cala mais forte, mesmo que seja por e-mail.

# Agora mesmo li Contra Naturam

# Ontem li Gemeinschaft e Gesellschaft
Um abraço do wilson luques costa

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Quem sou eu

Nascido na cidade de São Paulo em 15 de fevereiro de 1960. Formado em Jornalismo (UMC/1983). Professor titular do ensino médio da disciplina de filosofia. Pós-Graduado, em nível de Especialização, em Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes pelo Instituto de Psicologia (USP /2001). Entre os anos de 1999 a 2005, fez extensão universitária dos instrumentais de grego, latim e alemão, cursando também mestrado (sem concluir) em educação e filosofia. Autor de dois livros na literatura, do Ensaio Paradoxo do Zero (Fundação Biblioteca Nacional/2003) e do conceito filosófico O Princípio da Identidade Negativa. É verbete nos livros O Céu Aberto na Terra, Sobre Caminhantes, A vocação Nacional da UBE: 62 ANOS, Revista de arte e literatura Coyote.